Família das vítimas denuncia descaso de igreja e da OAB de Taubaté (SP).
A defesa do advogado José Benedito Serapião, de 64 anos, preso nesta terça-feira (27) em Taubaté (SP) após ser condenado a 48 anos de prisão por abusar sexualmente de três sobrinhos, informou que vai entrar com um pedido de habeas corpus no Tribunal de Justiça para que o cliente espere o julgamento do recurso em liberdade.
“Nós alegamos que isso foi uma trama que fez a cunhada dele, mães das crianças, contra a pessoa dele. A gente não sabe o motivo dela ter feito isso. É uma coisa fantasiosa”, disse Ary Bicudo, advogado de Serapião, que também atuava como ministro da Eucaristia na Paróquia Sagrada Família, no Jardim das Nações. Ele está detido na Penitenciária 2, de Tremembé.
A mãe denunciou o caso à polícia depois que ficou sabendo do abuso pela filha, que só teve coragem de contar no ano passado, quando já tinha 18 anos. Foi aí que veio à tona à violência contra os outros menores, todos sobrinhos do acusado. Logo que soube do que vinha ocorrendo, a mãe abandonou a moradia que era mantida pelo cunhado, alugou um imóvel e procurou a polícia.
“Eles eram todos criança na época, eles tinham nove, dez anos no máximo. A mais velha e na outra ele pegava a mão dela colocava nele, abraçava por trás, se esfregava. O meu filho ele levou em um terreno, abaixou a calça do meu filho, a dele e se esfregou nele por trás”, afirmou ela, que não quis se identificar.
Ainda de acordo com a mãe, as consequências do trauma estão no comportamento dos filhos. “A minha filha do meio é bem revoltada com bastante coisa, já está dando bastante trabalho na escola, arrumando briga, tive que trocar ela de escola. A mais velha já é mais quieta, fechada deu bastante trabalho para mim de sair, de beber. Ele também está dando bastante trabalho na escola ele já repetiu de ano”, contou.
O pai de uma das crianças conta que tentou ajuda de todas as formas. “A gente não teve apoio nem da comunidade católica, já que ele até hoje se você entrar no site da paróquia da Sagrada Família consta lá ele como ministro da Eucaristia. Enviei vários e-mails para a paróquia pedindo explicação, falando do que ele fez e até hoje não me responderam nada. Eles mandaram um padre de Tremembé testemunhar a favor dele, colocando a gente contra a parede, como se a gente tivesse feito alguma coisa errada. Pedi apoio da OAB [Ordem dos Advogados do Brasil] de Taubaté, nem uma vírgula eles deram para nós de apoio”, relatou.
Pela lei brasileira, a pena máxima de reclusão é de 30 anos. Se nenhum recurso for aceito, Serapião pode pagar apenas um sexto da condenação, portanto, cinco anos de detenção. Em seguida, ele pode passar para o regime semiaberto.
Falta de estrutura
Esse problema que mancha a infância e desestrutura a criança é muito mais comum do que se imagina. O Conselho Tutelar de Taubaté fez esse ano 174 atendimentos de crianças vítimas da violência doméstica, dentre eles casos de abuso sexual. De acordo com o Conselho, os pais precisam ficar atentos aos sinais que as crianças dão quando são vítimas de qualquer tipo de violência, como falta de apetite, excesso de sono ou a falta dele, agressividade, dificuldade de relacionamento e problemas na escola são sinais de alerta.
A situação pode ser ainda pior em casos como esse, pois segundo Alessandra Freitas, conselheira tutelar, o município ainda não tem estrutura adequada para dar apoio a essas vítimas. “Hoje, o município oferece apenas o Gavvis [Grupo de Apoio às Vítimas de Violência Sexual] para a criança e ela precisa de um atendimento mais especializado, com relação a atendimento psicológico, atendimento de saúde de uma forma geral e atendimento do serviço social. As mulheres vítimas de violência sexual recebem atendimento. Existe uma parceria do Gavvis com o Caps [Centro de Apoio Psicossocial] infantil que acolhe a demanda da criança, mas a gente sabe que não é o serviço específico”, afirmou.
Outro lado
Sobre a denúncia do Conselho Tutelar, a Prefeitura de Taubaté informou, por telefone, que discorda e que no município o Caps Infantil atende crianças vítimas de violência doméstica de forma adequada.
Nenhum representante da Igreja Sagrada Família e da diocese de Taubaté foi localizado para comentar o pedido de ajuda que os pais das vítimas relatam ter feito.
O atual presidente da OAB de Taubaté, Guilherme Viana, disse por telefone que neste ano não recebeu nenhuma denúncia contra o José Benedito Serapião e informou ainda que vai aguardar o julgamento final do caso para avaliar quais medidas serão tomadas.
Já Aloísio Nobre de Jesus, presidente da OAB na época em que o pai de uma das vítimas procurou o órgão para denunciar o caso, disse que quando ele entrou com pedido para afastar Serapião, foi orientado a se manifestar perante à comissão de ética em São José dos Campos, pois como a acusação não indicava crime enquanto exercia a profissão, ele não poderia tomar atitude alguma.